sexta-feira, 28 de maio de 2010

CANTEIROS, por Solange Sólon Borges

"Envelhecer como se já tivesse amado"
(Clarice Lispector)


Há dias de Sol tão forte que me abro inteira — feito cortinas —, assim as perdas queimam e secam as cicatrizes. Quero violetas com flores porque o trabalho de cura é só meu.

Não aceito migalhas, sou terra a ser regada. Meu coração alerta que a alma necessita de canteiros: para que se torne plena, reflita luz e as flores invadam meu sono audaz. Vou plantar guelfos e duendes sorridentes nos jardins para que não haja mais martírios. Gerânios fresquíssimos nascem.

Amor é plenitude e nunca subtrai: não há nome para determinadas dores expostas. Há a posse muda, porque não concordo que seus contornos visitem outras existências. Não existem regras, são as razões do meu bem-querer, pois cavalos alados de amores pateiam velozes dentro de mim, espantando lobos que cerceiam meus sonhos, projetando sombras no porão.

Quando respirei intensa pela primeira vez não havia trincadura e a terra se encharcou em demasia. É preciso secá-la, preparar o campo, cuidar do banho, cobrir-me de luz e me sentir belíssima, tornando a alma macia para que ao ouvir os meus gemidos não os tome como dores precipitadas, mas os entenda como arrulhos de prazer atroz.

Tenho vontade de delicadezas em dias ensolarados — fazer dobraduras, comer doces, visitar casas com vitrais coloridos, ver crianças brincando —, coração em encanto. Alinhavos do cotidiano.

Quando irei florescer de novo? Fico nesse torpor que passa internamente e que não é sopro, nem vírgula, nem êxtase. Quero conquistar permanência... Onde a nossa casa ancorada no tempo? Até onde posso mergulhar em minha profundidade?

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