terça-feira, 22 de junho de 2010

A VIAGEM DE SARAMAGO, por Humberto Kzure

Recebi, após um rápido bate-papo no Metrô, e retransmito a todos.
Um abraço, Helder

Caro Helder Miranda, escrevo-lhe de pronto. O tempo passa. Foi um prazer conhecê-lo, esperando em breve um encontro em Santos. Aproveito e envio uma mensagem que escrevi para amigos por conta da partida de Saramago. abc,
Humberto Kzure
Arquiteto, Urbanista e Cineasta - Prof. UFRRJ




"Caros amigos,

em 18 de junho de 2010, o Silêncio. Apenas alguns segundos de reflexão.

Ainda é possível emocionar-se nessa vida da hipermodernidade? (termo utilizado pelo filósofo contemporâneo francês Gilles Lipovetzky) Ou só nos emocionamos a partir da necessidade do consumo exacerbado, impetrado pelas armadilhas da propaganda e da mídia? Hoje, o "ter" (em demasia) é protagonista em relação ao "ser". Nessa hipermodernidade, e também era do "medo" como ressaltava nosso saudoso geógrafo Milton Santos, tudo parece descartável; inclusive as pessoas. Fenômeno sociocultural muito presente nas metrópoles e que se espalha como tentáculos obscuros para os centros urbanos menores.

Morreu José Saramago. Ou melhor, Saramago voou para o infinito, entre luzes e trevas. "A viagem do elefante” nos deixa um imenso vazio nesses "Ensaios sobre a Cegueira e Lucidez" - humana. Tanto como voz das "letras portuguesas", como expoente do grito de liberdade humana e contestação política, inclusive da própria noção de democracia. Portugal acordou triste. O mundo ficou mais triste. Eu também fico triste. E, ao emocionar-me diante de tamanha perda, percebo que ainda posso ter momentos de profunda lamentação. Esse Nobel da Literatura nos conforta pela obra que herdamos sem fazer qualquer esforço.

Fico a pensar o que será das letras em mundo cada vez mais veloz e contraditório. Vivemos entre ser diferente e a indiferença (Lipovetsky), e escassez e ausência de respostas - qualquer que seja. Talvez por isso, fui alimentar-me de mais emoção ao assistir ao filme "Cartas para Julieta". Além de ver a sábia atriz inglesa Vanessa Redgrave, com o brilho em seus cabelos alvos e olhos de azul profundo, cada vez mais acredito estar certo: o cinema nos poupa, ou nos liberta, dos divãs psicanalistas.

Nesse dia intenso de emoção, trabalhamos em nosso documentário sobre os apartados da vida hipermoderna - os pobres; mas não menos isentos e também cúmplices dos impactos do consumismo; do supérfluo. Como Saramago, também vou "cuspir marimbondos" através de imagens, como voz de oposição a esse mundo que insiste em criar (in)verdades e abismos descortinados para os mais desavisados.

E só! Afinal, cartas (e:mail's) são para ser enviadas sem esperar respostas (Villa Lobos).

Toque no coração; apenas!"

Humberto Kzure-cerquera

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